A caminho do hotel passávamos todos os dias pelo Hipódromo. A familiaridade do lugar impedia-nos de o ver, mas numa noite regressados de um passeio pelas bandas da ponte Galata, “descobrimos “o Hipódromo de Constantinopla, que hoje se chama Sultanahmet Meydanı (Praça Sultão Ahmet).
Naquela hora estava vazio, silencioso, molhado, forrado a sépia pela luz amarela dos candeeiros. Olhámos como se fora a primeira vez o lugar que foi o centro desportivo e cultural de Constantinopla, a cidade de Constantino. Foi este imperador que transferiu o governo de Roma para Bizâncio transportando para a cidade obras provenientes de todo o mundo. A coluna da serpente, como é conhecida, veio do Templo de Apolo em Delfos, e era então rematada por uma bola dourada suportada por três cabeças de serpente. Às cruzadas, guerras e saques só resistiu a coluna ondeada e algumas peças que se encontram no Museu Arqueológico de Istambul.
No centro da praça, ergue-se um enorme obelisco egípcio. O cume perde-se na escuridão da noite com os hieróglifos a lembrar a sua origem. Foi Teodósio, o Grande, que fez transportar nos finais do século IV o monumento em granito rosa que fazia parte do Templo de Karnak em Luxor (1500 a.C). Para registar a sua marca pessoal, Teodósio colocou o obelisco num pedestal de mármore com cenas do imperador e da sua família a apreciar as corridas..
É difícil imaginar aquele espaço original em forma de U com 100 000 espectadores que se emocionavam com as corridas de cavalos e que apoiavam as diferentes equipas: os Azuis, os Brancos, os Roxos , os Verdes … É difícil imaginar a pista de então decorada com estátuas de bronze de cavalos e de aurigas famosos. Tudo desapareceu! Mas é possível rever uma quadriga em bronze que ficava no extremo norte do Hipódromo de Constantinopla: os quatro cavalos estão na fachada da Catedral de S. Marcos. Precisamente: em Veneza.
Seguir as andanças de tantas obras saqueadas por todo o mundo daria, por certo um roteiro de viagem que só a História pode justificar.