Cruzeiro no Bósforo

15 de Fevereiro, 2013

Desde o tempo das aulas de geografia que o Mar Negro nos causava estranheza e curiosidade. Aparecia ali no mapa entre a Europa, a Anatólia e o Cáucaso. Fazia um bocado de impressão aquele fechamento, aquele mar interior que se ligava por vários estreitos ao oceano Atlântico. A ligação que nos parecia mais fascinante era a que se fazia pelo Bósforo até ao Mar de Marmara a obrigar passagem por Istambul. Por isso, o cruzeiro no Bósforo até ao enclausurado mar era um projeto antigo de descoberta.

Resistimos às insistentes propostas de cruzeiros exclusivos no cais de Eminonu. Sabíamos que era o ferry usado pelos istambulenses que nos levaria numa viagem mais calma até ao avistamento do Mar Negro. E assim foi.

Subimos ao deck superior e, como sempre, deslumbramo-nos com o recorte da torre Galata, da ponte com os seus pescadores residentes, com as cúpulas das mesquitas, com os cemitérios encostas abaixo.

A viagem dura 90 minutos e faz cinco paragens para largar e apanhar passageiros: Besiktas Kanlinca, Yenikoy, Sariyere terminando em Anadolukavagi. A viagem é relaxada mas são frequentes as mudanças no deck do ferry para não perdemos nenhuma cena importante do filme da vida que acontece nas duas margens. Ali mesmo à beira da água, o Palácio Dolmabahçe, com a sua fachada de mármore denuncia as riquezas do seu interior. Fizéramos há uns anos uma visita e mais dos que os candelabros de cristal e os imensos dourados dos salões, recordámos os relógios parados nas 09:05, hora a que morreu Attaturk. Prometemos voltar.

A proximidade das margens, aproxima-nos das vidas quotidianas de turcos de todas as idades: há muitos jardins, pequenas esplanadas, ruas animadas pelos mercados de frescos … mas os nossos olhos são levados pela curiosidade em registar as “yalis”, mansões de madeira sobre a água que foram durante décadas usadas pela grande burguesia de Istambul. Muitas estão em avançado processo de degradação porque são na maior parte dos casos feitas em madeira e porque os seus donos conheceram a decadência. Ao vê-las, lembramo-nos das referências de Pamuk a estas casas com deck privado para atracar os barcos de recreio.

A viagem termina em Anadolukavagi, uma povoação piscatória que tem junto à água inúmeros restaurantes. Iniciámos a subida da colina que nos levaria até ao castelo de Yokos. Demorámos cerca de uma hora até chegar ao topo do que resta daquela que foi outrora uma fortaleza estratégica para os bizantinos, genoveses e mais tarde para os otomanos. Poderíamos ter demorado metade do tempo mas fomo-nos perdendo pelos horizontes que entrevíamos por entre as árvores, pelas hortas em volta das casas, pelas pessoas com que nos íamos cruzando.

A vista que se tem do encontro entre o Bósforo e o Mar Negro não desapontou as nossas expectativas adultas. O dia estava radioso e transparente. Ao olhar o Mar Negro veio-nos à memória alguns rios que o alimentam, o Danúbio, o Don, o Dnieper e logo uma vontade grande de os conhecer.

Mas Istambul esperava-nos. Chegamos ao pôr-do-sol com os muezin de dezenas de mesquitas a chamarem para a oração.

 

Às portas de Istambul ….

27 de Setembro, 2012

Um amigo que conhece bem o nosso gosto por Istambul enviou-nos um poema com o título “Viver Istambul”. Lemos e reconhecemo-nos em tantas imagens registadas nos vinte e sete versos. Não trazia identificada a autoria e, por isso, procurámos pesquisando no Google, inquietando entendidos nas lides poéticas … mas nada! Sabemos que foi publicado numa terça-feira, precisamente a 11 de Agosto de 2009, no blog “Memória do Mundo” que já se calou há muito. Enviámos emails para um endereço que se deve ter perdido em qualquer esquina virtual. Imaginamos que pode ser uma mulher por associação ao nickname Mnemosine e ao tríptico do cabeçalho.

Gostávamos de identificar o/a autor/a e, por isso, este post. Quem sabe se alguém que nos lê sabe de quem são estes versos que tão bem contam Istambul. Não podemos oferecer uma viagem à cidade a quem nos der a informação mas ficaríamos muito gratos!

Aqui fica o poema de um(a) desconhecido(a):

 

Viver Istambul

Às portas de Istambul  ficam

Pensamentos carregados, abandonado

À sua sorte nos sapatos

E o chão, percorrido de tapetes

Por onde passam, a todo o momento

Gatos

Agracia os nossos passos

Os altos minaretes

Indicam a direcção de novos pensamentos

O olhar eleva-se a

Um sereno céu turquesa

E ai fica, reverenciando

As alturas das mesquitas, dos palácios,

Guardiões repousados

Em profunda meditação,

Pressentindo só a silenciosa presença

A brisa delicada do Bósforo

Empoalha de ouro a minha pele

Pelo ar, alecrim e açafrão

Parados

Uns olhos húmidos cativam os meus

Oferecem-se a uma memória

Istambul enche a minha alma de céu

Os meus-teus braços

Erguem-se ao azul

E rodopiam, ora em transes derviches,

Ora em ritmos de harém.

 

Um louco amor no museu

16 de Maio, 2012

Finalmente abriu, em Istambul, o Museu da Inocência. Contámos no post de dezembro de 2010 a nossa demanda em busca do que na altura não existia: um museu na rua Çukurcuma, anunciado por Orhan Pamuk no romance de 2008 “O Museu da Inocência”.

Retomemos a história passada entre Maio de 1975 e os últimos anos do século XX, que se conta rapidamente, sem que isso retire qualquer interesse a futuros leitores: Kemal é um jovem empresário filho de uma família abastada, frequenta os meios burgueses de Istambul e está noivo de Sibel, uma turca moderna que conhece bem a Europa. Passa parte do Verão numa casa nas margens do Bósforo (yalis) e com os seus amigos partilha uma admiração pelo modo de viver europeu. Perde-se de amores por uma prima afastada que é empregada de balcão.

Esta paixão obsessiva leva-o a recolher objetos que Fusun tocou ou usou e que ele guarda: beatas (mais de 4 000), travessões, brincos, lenços, sapatos, bilhetes de cinema e de autocarro, copos usados por ela. Com estes objetos decide preservar a sua paixão num museu, o que o leva a visitar 1743 museus do mundo para usar a metodologia mais adequada à sua constituição.

Artefactos expostos no Museu da Inocência / Bulent Kilic (AFP)/El Pais

A inauguração do museu foi sendo sucessivamente adiada, até que, finalmente, há cerca de quinze dias, o museu abriu as suas portas. Nos três andares do edifício vermelho da rua Çukurcuma, podem-se ver, segundo as reportagens dos jornais, milhares de objetos que refletem um tempo de uma cidade e que cumprem o desejo de Pamuk “Quero que o meu museu seja o museu da cidade, que inclua tudo, desde mapas das ruas, a fechaduras, a maçanetas de portas, passando por telefones públicos e o som das sirenes de nevoeiro”. Afinal, “documentos de uma Istambul que já não existe e um olhar poético ao passado da cidade através dos olhos de um apaixonado”, “Quero encher [o museu] modestamente com as coisas que fazem a cidade, que fazem qualquer cidade”.

As 639 páginas do romance são, assim, muito mais do que a história de um amor desmesurado de um homem por uma mulher: são antes de tudo a manifestação do amor por Istambul e o desejo de preservar a memória de uma cidade, de um tempo marcado pela nostalgia, pelo huzun.

O museu já tem um site:

http://www.masumiyetmuzesi.org/W3/Default-ENG.htm que anuncia que se levarmos o livro se cumpre a promessa do autor: na página 626 está um bilhete que dá direito a uma entrada individual no lugar onde parte da memória sentimental de Pamuk reside.

 

Objetos expostos no Museu da Inocência / Tolga Bozoglu (EFE)/ El Pais

 

Istambul por outros olhos

4 de Abril, 2012

 

Não é fácil aceitar outros olhares sobre um lugar que julgamos conhecer bem e que amamos. Por isso, foi feliz o encontro com o texto de reportagem da jornalista Ana Cristina Pereira publicado no FUGAS do jornal PÚBLICO: reconhecemo-nos, reconhecemos os lugares associados a sentires únicos e redescobrimos sítios e paisagens. Por isso, faz todo o sentido integrarmos no nosso blog a reportagem que foca o lado lunar de Istambul e, por isso, o seu lado luminoso. Já on line, pode ser lida AQUI.

A acompanhar as palavras da jornalista as fotografias cúmplices de Vitor Costa, a preto e branco, a condizer com o texto. Reproduzimos aqui algumas.

Visitem a reportagem porque há muitas maneiras de visitar ou revisitar Istambul. Esta é, seguramente, aliciante!

 

Com os pés no lado asiático de Istambul

15 de Março, 2012

 

Geralmente, a maior parte dos viajantes que visitam Istambul ficam fascinados pelo lado europeu da cidade limitando-se apenas ao avistamento do lado asiático que brilha ao longe iluminado pelos reflexos do Mar de Mármara.  Quem não põe os pés na outra banda não sabe o que perde!

A viagem de ferry  dura 20 minutos e vale por si: Istambul que se afasta, os contentores e guindastes do porto do lado asiático animam-se com os mergulhões, as gaivotas perseguem o pão atirado dos decks, os vapurs navegam em todas as direções …

É com alguma emoção que se pisa a antiga península da Anatólia que conhecemos da História. Os vestígios da fixação humana são mais antigos do que de qualquer parte da Europa. A primeira cidade grega (Calcedónia, atualmente Kadikoy) foi fundada em 675 aC, dezassete anos antes de Bizâncio. Não há muitos vestígios do passado porque devido à situação geográfica esta zona foi devastada por guerras frequentes.

Saímos no porto de Kadikoy que, juntamente com Uskudar, é uma das zonas mais desenvolvidas e com intensa atividade comercial. Desde cedo, na viagem de ferry, vemos um edifício imponente, a estação de Haydarpasa, que parece “deslocado” do ambiente: o estilo é neo-clássico, obra dos arquitetos alemães Otto Ritter e Helmut Conu que foi oferecido pelo imperador alemão Wihelm (1909).

A zona junto à estação tem pouco edificado porque grande parte pertence ao exército. Numa das alas de um dos quartéis, há um museu dedicado a Florence Nightingale que só pode ser visitado com marcação. Foi aqui que a enfermeira Florence desenvolveu a sua importante atividade junto de soldados britânicos, franceses e turcos feridos durante a guerra da Crimeia.

Percebemos que o lado de lá de Istambul é diferente antes de mais porque há poucos turistas nas ruas com um intenso movimento de pessoas que entram e saem das lojas. Mas tal como nas outras zonas de Istambul, os seus habitantes reservam momentos do dia para sós ou acompanhados olharem as águas e os céus que banham e envolvem a cidade. É esta atitude de contemplação que nos questiona. O que é que esses olhares privilegiam? O espelho de água, o movimento intenso das embarcações, as gaivotas, os céus limpos ou enevoados, o perfil do outro lado da cidade? Ou olham para dentro de si mesmos?

Quando voltarmos a Istambul, sentar- nos-emos num banco de qualquer margem, olharemos o horizonte e esperaremos que esse estado nos proporcione a contemplação que a cidade inspira.

Ver e ouvir a Cristina em Istambul

18 de Janeiro, 2012

Eram cerca das 21:00 e passeávamos na Avenida Istiklal que se mantinha cheia de gente em passo razoavelmente relaxado. As lojas ainda estavam abertas e os carrinhos de toldos às riscas vendiam castanhas quentes e milho assado. A multidão falante provoca um som morno, um burburinho colectivo que é manso.

De vez em quando ouve-se a campainha do eléctrico que nervosa e incisiva avisa que é preciso que se afastem dos carris. A multidão aparta-se sem pressas porque não acredita em atropelamentos naquele lugar que é propriedade dos peões.

De súbito, ouvimos uma música cantada em português. Procuramos de onde vinha o som e olhamos uma janela iluminada. Do alto do segundo andar, emoldurada por um florão  de pedra, a janela deixava ouvir o canto limpo da Cristina Branco que dizia: “sete gritos por gritar, sete silêncios viver, sete luas por brilhar e um céu para acontecer“.

Conhecíamos bem a letra da canção e, mesmo sem jeito, fizemos de coro cantando para a janela. Lembramo-nos que foi um amigo holandês que, há uns anos, nos deu a conhecer a Cristina já famosa na terra dele e quase desconhecida na nossa.

O destino dá muitas voltas e quando regressarmos a Istambul, entre 18 e 23 de Fevereiro com um grupo de portugueses, vamos poder ver e ouvir a Cristina ao vivo no auditório Cemal Reşit Rey Konser Salonu, no dia 22 à noite. Talvez a desconhecida janela com o seu florão apareça também.

 

Sete pedaços de vento AQUI

 

Istambul em números

9 de Janeiro, 2012

 

No nosso blogue, privilegiamos as experiências que vamos acumulando nas viagens que fazemos a Istambul em que as fotografias têm um papel muito importante. Alguns leitores colocam-nos questões objectivas sobre o número de habitantes, a economia, educação, saúde, etc. Encontrámos alguns destes dados num documento publicado pela municipalidade de Istambul (2010). Partilhamos esses números que ajudam a compreender melhor a cidade.

Demografia
População: 12.915.158 (2010)

Densidade populacional: 2.444 pessoas/km2 (26 vezes o número do resto do país que é de 94 pessoas por km2)

Taxa de crescimento da população: 3.3 % por ano;

35 % da população vive no lado asiático e 65 % no lado europeu

51 % da população é constituída por homens (na Turquia a taxa é 50%);

62.24 % da população nasceu fora de Istambul.

Geografia
Área: 1,830.92 km2
Elevação: 100 m.

Coordenadas: 41.09 Norte, 29.42 Este

Montanha mais elevada: 537 metros (montanha Aydos no lado asiático)

Concelhos: 151
  Freguesias: 817  
Distritos 39

Clima
Temperatura média: 13,6º

Taxa média de humidade: 79 %

Temperatura média do mar: 15-16º

Edificações

Habitações: 869.444
Mesquitas:  2.944 (em 2009)

Igrejas: 50

Sinagogas: 16

Universidades: 29

Trânsito
Veículos motorizados: 2.710.802 (1 carro por cada 5 pessoas) em Agosto de 2009 (estima-se em 3 milhões em 2010)

1/5 dos carros na Turquia (aproximadamente 13.800.000 nos finais de 2008) estão em Istambul. Cerca de 500 carros novos por dia!!!

Estradas: 25.000 km

Polícia de trânsito: 2.293

Táxis: 17.395 (em 2010)

Autocarros: 3.838

Veículos: 2 441 667 (em 2007)

Pontes: 2 sobre o Bósforo (537.000 liras turcas em portagens pagas diariamente por cerca de 381,091 veículos)

Aeroportos: 2 internacionais, 1 privado, vários aeroportos militares

Barcos de pesca:  2 058

Turismo
Turistas: 7.049.234 (em 2008), 28% das chegadas totais à Turquia (cerca de 26 milhões de turistas em 2008)

Hotéis/Motéis: 766 (28 de 5 estrelas, 57 de 4 estrelas, 80 de 3 estrelas, 75 de 2 estrelas, 18 de uma estrela, 38 com categorias especiais)

Camas: 93.300 (Agosto de 2010)

Agências de viagem: 1 511

Monumentos:  63 museus, 64 mesquitas históricas, 66 escolas corânicas históricas, 49 igrejas históricas, 1 sinagoga histórica, 17 palácios

Estabelecimentos de lazer:  405

Economia
Orçamento municipal: cerca de 18 biliões de LT (liras turcas)

Contribuição para o orçamento nacional : 6.454.947 milhões LT

% no PNB: 23

%
Fluxo de divisas: 3 820 386 391 TL

Total de depósitos no sistema bancário turco: 25%

PNB per capita: 3.063 USD (7º na Turquia, sendo 1ª a província de Kocaeli com 6,165 USD)
%  na colecta fiscal nacional: 40%

Filiais bancárias: 1.730 (aproximadamente 29% do total)

Zonas de Comércio Livre: 4 (Trácia, aeroporto Ataturk, Industria de Couros, Bolsa)

Import/Export: 57% das exportações e 60% das importações centram-se em Istambul (em 2005), maior exportação é textil

Firmas comercias: 267.248 (63.31 % de sociedades), 29,5 % do total da Turquia

99% dos trabalhadores são do sector privado
1% são funcionários públicos (30,5 % do total de trabalhadores da Turquia encontram-se em Istambul)

53.3 % da população trabalha nos serviços
 32.2 % na indústria
 8.1 % na agricultura 
6.2 % na construção (em 2000)

Taxa de desemprego: 15,5 % (461.185 pessoas)

Segurança Social:  4.057.090 pessoas, cobrindo cerca de 90% da população

Educação
Taxa de literacia: 93.39 % (com mais de 6 anos de idade), à frente da média nacional (87,32 %)

Estudantes: 2 323 628 (ensino primário e secundário)

Escolas primárias e secundárias: 2 707

Universidades 23 (29 % das universidades da Turquia estão sediadas em Istambul)

70% dos estudantes frequentam universidades públicas;

30% frequenta universidades privadas

Saúde
Hospitais: 194 (em 2005), 71% dos quais (140) são privados

Camas de hospital:  33,721 (em 2004)

Médicos: 12.827 (1.617 doentes por médico)

Farmácias: 4.494

Centros de sangue: 31

Centros de diálise: 70

Laboratórios de Raio X: 350

Lares da Terceira Idade: 61 (33 são privados), com 5.535 camas (em 2004)

Cultura
Bibliotecas: 72

Centros culturais:  62

Centros de congressos/feiras: 8

Salas de Concertos: 28

Cinemas: 70

Teatros: 23

Galerias de arte: 68

Jornais: 337 locais e 28 jornais nacionais

Media: 15 estações de televisão e 130 estações de rádio

Desportos
Desportistas registados: 105.009 (61.708 activos)

Estádios:  16 relvados (com capacidade para 139.729 espectadores) e 11 de terra batida

Tiro Olímpico: 1

Salões de bowling: 9

Campos de golfe: 3

Futebol:  5 equipas na 1ª Liga, 11 equipas na 2ª Liga, 10 equipas na 3ª Liga (na época 2008-2009)

Clubes desportivos:  470 clubes de futebol, 190 de basquetebol, 92 de voleibol, 16 clubes para deficientes, 251 de karate/judo/taekwandoo, 68 de boxe

Consumos básicos
Consumo de electricidade: 22.983.837 milhões  Kw/h por ano

Consumo de gás natural: 3.757.000.000 m3

Consumidores de gás natural: 3.005.000 (eram 172,000 em 1993)

Consumo de água: 2.000.000 m3 por dia, 174 litros por pessoa por dia

Fonte: Municipalidade de  Istambul

Os pescadores de Istambul

26 de Dezembro, 2011

Sempre admiramos os pescadores que passam horas e horas agarrados à cana de pesca com os olhos postos num eventual movimento denunciador da presença de peixe. Nunca ousamos falar com nenhum com receio de interromper o que parecem ser profundas reflexões sobre o mundo, a vida e sabe-se lá que mais.

Achamos os pescadores de Istambul especiais, porque são muitos, mesmo muitos, ao longo das vastas margens do Bósforo e do Mar de Mármara, e não é exagero dizer-se que fazem parte da paisagem da cidade. Vimos, na ponte Galata, talvez a maior concentração de pescadores por centímetro quadrado: de dia e de noite, a ponte está cheia de pescadores, muitos dos quais controlam mais do que uma cana.

O calor intenso do Verão, a chuva e a neve de Inverno, não esmorecem a militância da pesca. Cobrem-se de plástico quando a chuva é intensa e, nas noites geladas, levam aquecedores a gás que partilham. Aliás, deve ser a única coisa que dividem entre si porque a sabedoria, a arte, é de cada qual …

O silencio é aqui mesmo de ouro e até os vendedores de milho assado, simit, doces e frituras se aproximam suavemente, comunicando por gestos não vá o peixe espantar-se. O barulho dos carros, dos ferries e dos barcos que cruzam a ponte por cima e por baixo, não conta, parecendo não perturbar nem pescadores nem pescaria. A saída de peixe é frequente e dá gosto ver no fio dançarino um peixe que num ápice aterra em baldes cheios de água.

Confessamos que somos mirones interessados em pescadores, sobretudo os de Istambul e, muito especialmente, os que pescam no tabuleiro da ponte que une as margens separadas por um braço do Bósforo. Percorrer a ponte Galata de dia e de noite vale pela paisagem que se desfruta e vale muito também pelos pescadores que a habitam.

 

A espera em Istambul

28 de Novembro, 2011

 

Na mesquita, o tempo era de oração e, por isso, tínhamos de esperar. Queríamos repetir fotografias das abóbadas iluminadas pela luz da manhã de sol e estava fora de questão desistir.

Conformamo-nos  à espera na fila de turistas que se ia formando. E foi o olhar preguiçoso que começou a descobrir as sombras na parede, as fissuras da pedra, os gatos que esperavam uma meiguice nossa, as formigas que saiam de um buraco, as pegadas no chão, as folhas recentemente caídas. Íamos sentindo o lugar do tempo, de tantos tempos presentes naquele lugar.

De repente, aquele pequeno mundo que nos rodeava ganhava um imprevisto interesse e foi com pena que ouvimos o inglês que nos seguia na fila dizer que devíamos avançar.

A experiência da espera prolongou-se no interior da mesquita ao olharmos os crentes e quando suspendíamos a respiração para não comprometermos a focagem das fotografias captadas com pouca luz.

Naqueles momentos e nos dias que se seguiram, passamos a percepcionar a espera de outro modo. Percebemos que a espera é uma aparente pausa na sequência da vida e que as esperas valem por si como componentes importantes do presente. Descobrimos que a espera nos deixa desfrutar o mundo de outro modo e que nos leva a pensá-lo e sentir-lo de outra forma.

Passámos então a olhar de outra maneira os pescadores na ponte Galata, os passageiros na estação de ferries de Karakoy, os crentes à entrada das mesquitas, os vendedores nos bazares, os homens e as mulheres nas esplanadas e nos jardins.

A espera pode ser mais do que uma pausa, as esperas podem ser momentos cheios de vida dentro. Descobrimos isso à espera, em Istambul.